"O ar estava tão denso que de vez em quando era preciso espantá-lo com as mãos, como se faz com mosquitos. A gente estava suado como se tivesse tomado chuva. Mas claro que não iria chover ali. Entramos num dos barquinhos salvadores.
Estava com a maior cara de que os donos tinham acabado de sair. Não podíamos esperá-los para que dessem permissão. Peguei a água que estava em um cantil jogado ali e dei para ela beber. Molhei um pano com o resto da água do cantil e dei pra ela morder. Afastei tudo da frente, e vi que o barco estava, como imaginado, limpo.
Não muito tempo depois, ouve-se o choro, cantando junto das cigarras.
Enrolei o bebê com minha camisa. Lavei na água do rio, para cortar o cordão, uma faca que estava no barco. E choramos os três.
Observamos as coisas dos donos do barco. O cantil, agora vazio. A faca, novamente lavada. Um cesto vazio. Uma mochila que não tive coragem de abrir. Sandálias de couro. Um radinho de pilha.
Ao sair, a gente deixou um pouco do pouco dinheiro que tinha e um bilhete: 'Obrigado pela manjedoura'."
Luciano J Fernandes
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